segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Por um modelo eficientemente humanizado
A luta antimanicomial surgiu no final dos anos 80, após medidas que passaram a ser tomadas decorrentes da designada “Reforma Psiquiátrica”. Ela faz uma forte crítica ao antigo modelo de hospital comumente chamado de manicômio ou hospício e defende que um paciente não deve ser “enclausurado”. Desde então, a reforma tem encontrado certos obstáculos, gerado discussão, tem acertado e cometido equívocos.
Muitas vezes, a imagem que se tem de hospitais psiquiátricos é a construída a partir da de um manicômio. Lugares mal cuidados, médicos grotescos, choques elétricos não apropriados (sim, existem os apropriados e inclusive aconselháveis), violência física e moral como ilustra, por exemplo, o filme nacional “Bicho de sete cabeças”, protagonizado por Rodrigo Santoro.
Muito ao contrário daqueles, os atuais hospitais psiquiátricos têm a mesma finalidade que qualquer outro hospital especializado: promover a qualidade de vida e bem-estar do paciente. É óbvio que muitos não são exemplares – assim como em todas as subáreas médicas –, mas a maioria dos hospitais psiquiátricos visa e exerce o trabalho humanizado.
Se considerarmos a quantidade de hospitais que ainda funcionam como hospício, a fase antimanicomial poderia até mesmo ser considerada ultrapassada, pois são exceções (e esses sim devem ser eliminados). O que talvez não seja explicado, principalmente para a sociedade civil, é que a luta hoje é anti-psiquiatria hospitalar e, não raro, contra o uso de psicotrópicos, que são indispensáveis em muitos tratamentos.
Ocasionalmente acontece o não reconhecimento do doente mental como uma pessoa que precisa de cuidados médicos, ou então se ignora o fato de que a origem dessas doenças é também orgânica. Quando alguém apresenta uma doença do coração, busca um cardiologista. Se o caso é gravíssimo, por vezes, ele é encaminhado a um centro especializado nesse campo e ali é internado, pois poderá encontrar atendimento adequado para evolução do caso.
As internações psiquiátricas atualmente acontecem apenas mediante surtos psicóticos e por períodos breves, além do que o número de pacientes que necessita delas é bem pequeno, mas existe e sempre existirá. Há também pacientes crônicos que não respondem a medicações e apresentam quadros altamente agressivos, o que impossibilitaria, por exemplo, a convivência familiar e em sociedade.
Ao focar a luta em si, o que parece mais controverso é o fato de as passeatas anuais em prol da campanha nem sempre sustentarem uma idéia eficiente. Em Uberaba, é organizado o “Carnaval dos Loucos”, que, embora vise à inclusão dos que apresentam sofrimento mental, acaba por expô-los. No ano de 2010, por exemplo, foi criada uma marchinha para o bloco da fundação psicoterapêutica “Gregório Baremblitt”, que dizia “dividir a loucura do dia-a-dia. E viver (...). Doido, pinel, maluco, pancadão”. Ela era cantada pelos participantes da instituição que vestiam fantasias diversas. Tudo bem, é carnaval, mas anunciá-los dessa forma é mais ou menos como em uma parada do movimento gay, que busca uma colocação equiparada na sociedade, o grito de protesto fosse: “veado, bicha, sapatão”.
O que se deve, na verdade, exigir da reforma no modelo de assistência em saúde mental no Brasil é a qualidade, a humanização e a eficiência dos atendimentos prestados àqueles que apresentam transtornos mentais. Pouco adianta a luta antimanicomial se não há alternativas capazes de garantir todas as modalidades de tratamento mental. Pouco adianta também, se não existir um tratamento interdisciplinar para tais doenças, envolvendo areas da psicologia, serviço social e outras terapias não medicamentosas.
Melina Paixão
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